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Lucidez, discernimento e o peso das decisões

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Coluna de Cultura e Sociedade — Revista EXAME.
Lucidez, discernimento e o peso das decisões.
Publicado em: 14/05/2022
Tempo de Leitura: 4 min de leitura

Lucidez, discernimento e o peso das decisões
Crianças ianomamis: o Brasil é líder em desmatamento florestal (Reuters/Adriano Machado)

Em uma mesa de negócios, os bons executivos usam evidências para tomar decisões. E quando as decisões são de caráter político?

Não é difícil, para qualquer brasileiro ou brasileira, perceber que o Brasil não vai bem. Fome e o empobrecimento das famílias, somado a uma institucionalidade que vai se corroendo dia a dia pelas mãos de lideranças políticas que celebram delitos e desafiam as regras que criam confiança social, são fatos da triste realidade nacional.

Nas últimas semanas, não é pouco o que o país passou. De um indulto presidencial contra decisão da Suprema Corte, última instância de qualquer sistema judicial crível, ao desmatamento recorde, o que assistimos é um país capaz de esgarçar ao máximo os códigos que nos trouxeram a civilidade moderna. E que nos levam a engrossar a presença do país nas piores listas e índices internacionais que buscam traduzir avanços e retrocessos na comunidade global.

Se olharmos apenas para essas listas, o cenário brasileiro é desolador. O Brasil é líder em desmatamento florestal, o sétimo país no ranking de intolerância, um dos recordistas em desigualdade, um dos piores países do mundo para se trabalhar e onde a sua população mais teme a violência, está entre os cinco no ranking global de femicídio e ocupa o 13° em homicídios. Se incluirmos os rankings de competitividade (57° entre 64 países pesquisados) e o de recordista internacional no tempo que as empresas gastam com burocracia tributária, o ambiente geral que nós brasileiros vivemos é nocivo.

Fica a pergunta: o Brasil é capaz de gerir o seu presente e construir um futuro sustentável para a sua população?

O contexto atual obedece ao que os norte-americanos chamam de VUCA, um acrônimo utilizado para descrever períodos da história caracterizados pela alta volatilidade (volatility), crescimento da incerteza (uncertainty), um contexto global de grande complexidade (complexity) e a ambiguidade que rege o entorno das decisões (ambiguity).

Se o panorama global é VUCA, o Brasil adiciona as suas mazelas históricas e recentes.

E recaí sobre nós o peso da qualidade das decisões que tomamos como sociedade e a capacidade de aumentar o grau de racionalidade que usamos como balizador para cada uma delas.

Este é um ponto que persigo há décadas como consultora de grandes corporações. Quando se está em uma mesa de negócios, os bons executivos usam dados, evidências e cenários projetivos para tomar suas decisões. Mas é difícil encontrar a mesma racionalidade quando as decisões são de caráter político ou giram em torno de decisões de interesse público.

E o Brasil, mais do que nunca, precisa de lideranças que entendam em profundidade a história cultural do seu povo, o contexto que vivemos, os desafios que ele nos coloca como sociedade e o compromisso inarredável de assumir e contribuir para um modelo de desenvolvimento sustentável, social e ambientalmente. Isso implica em saber decidir com base na escuta ativa, na ampliação de parcerias com instituições representativas da sociedade e de olho em dados e informações que traduzem a nossa realidade e, portanto, o tamanho dos desafios que enfrentamos.

Como nos lembra a última carta de Larry Fink, executivo chefe da BlackRock, a sigla ESG não pode ser uma agenda destituída de princípios práticos e resultados aferíveis para a sociedade e o planeta. Não serão ações e projetos isolados, sem relação com a institucionalidade e as mazelas do povo brasileiro, que nos trarão crescimento com justiça social e um lugar de destaque no cenário global. É preciso mais. Assumir compromissos claros e de longo prazo com o país, como a pandemia nos mostrou ser possível, é o primeiro passo.